quarta-feira, 22 de maio de 2013

bonitinha

escrever não é assim fácil.
tenho ciência disso.
é só mais uma entre as tantas merdas
que não me levarão a lugar algum.

música, poker e isso.
sou a porra do adolescente
mais velho que conheço.
tento ver o lado positivo.

mas insistirei por um tempo.
pode ajudar por algum tempo.
e quando não mais funcionar
apenas pulo pra próxima.

não devo postar no facebook.
talvez se fosse mulher e bonitinha.
então choveriam curtidas,
comentários e elogios de todos
os que quisessem me comer.

Infância

- Não sei, velho. Não sei.
- Mas quando começou?
- Sei lá, bicho, acho que desde que eu aprendi a raciocinar.
- Nah vai, duvido. Alguma coisa aconteceu.
- Não, pior que é sério. Desde criança que eu acho tudo uma bosta, tudo meio sem sentido. As pessoas sempre vêm com esse papinho de que as crianças é que realmente são felizes, que não têm preocupações com contas, dívidas nem responsabilidades. Mas pra mim tudo sempre foi uma bosta. Era medo atrás de medo, encheção de saco atrás de encheção de saco. Acordar cedo, ir pra escola, ir pra cama cedo... a porra toda!
- Mas vai me dizer que não era melhor que agora?
- Não, não era! Agora pelo menos eu perdi boa parte dos medos. Cara, eu lembro como era horrível, ficar com medo de dormir sozinho e seus pais não deixarem você ir pra cama deles num dia específico. Ta certo que eles deviam ter motivos, deve ser um pé no saco você ali querendo trepar e um pentelho em cima sem desgrudar um segundo.
- Mas isso é normal cara, acho que todo mundo passa por isso.
- É normal mas é uma merda! É horrível! Na real acho que as pessoas se esquecem com facilidade dos problemas que tiveram no passado. Só sabem falar na porra das contas pra pagar e nas dívidas. Isso é egoísmo! Eu acho que um maldito monstro te espreitando no meio da noite é muito pior que tudo isso. Mas as pessoas não levam a sério porque sabem que o monstro não existe. Mas pra criança ele existe! Ele existe e isso é realmente foda!
- Eu lembro que depois de assistir uns filmes eu também ficava com umas nóias assim...
- Mas não é só isso. Eu também vivia com medo de que eles morressem, por exemplo. Meus pais. Lembro muito bem de estar sozinho em casa assistindo o Beakman e só conseguir pensar que eles tinham morrido num acidente de carro. Eles costumavam chegar sempre antes ou durante o castelo Ratimbum. Já tava terminando o Beakman e nada. Só no começo do Doug que eles enfiaram a chave na porta e eu pude respirar. Minha mãe me cumprimentou e me beijou com alegria de mãe. Escondi minha preocupação, minhas lágrimas e meu alívio. Reprimi qualquer palavra e aceitei suas desculpas. Trânsito, compras, algo assim. E claro que a gente nunca tinha ouvido falar em telefone celular nessa época.
- Celular quebra um galhão...
- É... Mas na verdade esse é um medo que me persegue até hoje. Meus pais morrendo eu to fodido. De vez em quando me pego revivendo aquela mesma cena. Principalmente sobre o meu pai que já ta velho e volta do trabalho pra casa de carro todo dia. Ao invés do Beakman a tela do monitor, ao invés do Doug o relógio...
- Foda...
- Agora, voltando... Pensa só outra coisa... eu duvido muito que você gostasse de acordar cedo pra ir pra escola.
- É... não, não gostava...
- E você costumava ir bem nas provas?
- Não, eu era da turma do fundão...
- Como seus pais reagiam?
- Acho que como todo pai...
- Broncas, brigas, castigos, etc?
- Algo nessa linha...
- Ok, eu também. Meus pais nunca me bateram nem nada. Mas era uma pressão infernal, era frustrante, um pesadelo. Era como ir pro trabalho todo dia. É sim uma puta de uma responsabilidade que te consome. E eu me sentia mal, me sentia anormal, me sentia muitas vezes uma pessoa má, que não dá valor ao esforço dos pais que se matam para pagar a melhor escola possível. Eu sentia o peso! E hoje, adivinha só! Hoje eu sei que eu estava certo. A escola é um inferno, a escola não presta, deveria ser extinta! Com malditos doze anos de idade eu já entendia mais que qualquer adulto que o mundo tinha algo de errado, algo de podre.
- Velho, as pessoas precisam de educação...
- As pessoas precisam de uma educação humana, não de um inferno disfarçado de educação! E isso acontece até hoje, aposto que a cada cem crianças “zumbis”, existe um gordinho feio e tímido pensando como eu pensava. Esse gordinho está sofrendo. Você não tem ideia o quanto. É uma maldição...
- Você era gordinho?
- Não, eu não era gordinho. Eu não era zoado pelas outras crianças. Quer dizer, eu sofri alguns bullyings mais pesadinhos durante dois ou três anos letivos mas o problema nem é esse. O problema é a vida.
- Sei lá, talvez se você procurasse ajuda profissional, de repente um simples remedinho muda toda sua concepção disso tudo. De repente você ta aí sofrendo a toa.
- Pode ser, penso nisso mais do que você imagina. Acho que quase todo dia na verdade. Mas não sei, eu não tenho mais esperança de porra nenhuma. Nada do que eu me meto funciona. Tratamentos, cirurgias, terapias. Já fiz psicoterapia por cerca de dois ou três anos! Era legal. É, era legal, mas não adiantou de porra nenhuma! É legal desabafar, falar as coisas. Mas e daí? Nada mudou. Prefiro desabafar contigo, com amigas virtuais, qualquer um. É de graça, não custa oitenta reais a hora.
- É diferente, eu não tenho o conhecimento que um psicoterapeuta tem. Imagino que suas amigas virtuais também não tenham. Com um especialista você tem foco! Pode estipular metas...
- Três anos! Não adiantou nada. Dinheiro rasgado! Comendo uma puta por semana talvez eu estivesse melhor.
- Haha, não duvido... Mas sério, e um psiquiatra?
- Um psiquiatra me diagnosticou como esquizofrênico uma vez.
- Ahn? Mentira, tu ta enchendo o saco!
- É serio. Esquizofrênico...
- Quando isso? E porque tu nunca me contou nada?
- Sei lá, tem tanta coisa que eu nunca te contei... foi quando eu saí do Bandeirantes, já tem uns dez, onze anos...
- Mas tu tinha que sintoma? Num vai dizer que ouvia vozes ou...
- Ouvia vozes porra nenhuma! Sei lá que sintomas, os mesmos que eu tenho hoje. Achava tudo uma merda.

tranco

o mundo parece mais belo quando
você está empurrando um carro
sozinho em plena Rua Araújo
enquanto seu pai tenta fazer ele
pegar e um cara grisalho, de
óculos, cinquenta e oito anos
aparece surgido do nada correndo
pela faixa de pedestres e se junta
à coisa toda até ouvirmos o
ranger do motor.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

o fundo


agora tento em papel
não creio que fará diferença
são tempos infernais.

você sente o fundo do poço se
aproximando. é escuro demais para
ver mas sente. que inferno são os
dias atuais.

não ser bom o bastante nas músicas,
no pôquer, nos poemas, no amor, na
amizade, no álcool, no trabalho, nos
estudos, nos desenhos, na vida, nos
livros, nos filmes, no sexo, em casa,
nos esportes, na saúde, na alimentação,
em porra nenhuma. morrendo em
busca do estilo e do reconhecimento.

talvez se escolhesse apenas um e
persistisse. não, impossível.

quantos já atingiram o fundo
nesta vida?

gostaria de conhecer todos eles.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Cine Ocupa


outro dia fui lá. minha amiga miou e
eu entrei apreensivo e sozinho pelo
portão vermelho aberto. uma garotinha
bonita e simpática se apresentou com
um abraço. um garotinho feio, tímido
e simpático que também estava meio
perdido me cumprimentou e depois
mais outro cara alto e barbado.

fui entrando e apertando a mão de mais
dois ou três sentados pelos cantos
comendo sanduíches e mais uma mina de
óculos num degrau. entrei na sala de projeção,
suja, bagunçada e confusa. o feinho logo se
enturmou e eu perguntei pr’um dos caras
lanchando onde ficava o banheiro. ele
prontamente se levantou pra me mostrar.

apenas uma das três cabines estava
disponível, as outras tinham papéis
colados na porta alertando para só
usar a cabine do lado direito. dentro
dessa havia outro recado grudado num
suporte de ferro com instruções sobre
como repor o papel higiênico. mijei,
puxei a descarga, sai e lavei as mãos.

perguntei à garota do abraço, que parecia
bastante ocupada organizando as coisas
e apresentando as pessoas umas às outras,
se o filme começaria as oito horas em
ponto como anunciado, a resposta saiu
meio hesitante e deu a entender que não.
ia demorar, costumava demorar. sabe-se
lá quanto tempo, não perguntei. mais três
chegavam e davam ois sorridentes.

de repente tudo me pareceu extremamente
esquisito e pintou um tipo de fobia que
costuma me atacar as vezes. peguei o celular
e, fingindo mandar alguns torpedos, escapei
dali portão afora. subi até a Consolação e dali
rumei direto de volta pra casa na chuva.

qualquer dia desses tento ir lá novamente.