segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Ressaca?


Sono agitado. Acorda. A mesma boca seca. Ânsia de vômito. O mesmo desconforto abdominal. Diarreia. Levanta. Espera que sua mãe não esteja no banheiro. Não vai tentar vomitar. As dez da manhã não há mais o que vomitar. Depois de cinco horas todo álcool já desceu e virou merda. Não há mais o que vomitar. Só há a sensação. Mesmo assim senta na privada procurando por um saco plástico em caso de emergência. Diarreia. Sua mãe grita qualquer coisa da sala e ele responde arrastando a fala. Se limpa, lava as mãos, olha no espelho, vai até a sala, bebe água, cai de volta na cama.
            Sono agitado. Acorda. A mesma boca seca. Ânsia de vômito. O mesmo desconforto abdominal. Diarreia. Espera que sua mãe não esteja no banheiro. Não vai tentar vomitar, as onze e meia da manhã não há mais o que vomitar. Só a sensação. Senta na privada, procura o saco plástico. Diarreia e a vista escurece. A já conhecida sensação do pré-desmaio. Destranca a porta para que sua mãe o encontre caso tenha um ataque. Diarreia.
            Tiago, faz um favor? Você pode vir aqui com o carrinho receber um processo que são vários volumes? ... Tá, eu estou recebendo uma documentação aqui, quando der eu vou. Uns dez minutos. Tiago, você pode vir aqui com o carrinho receber um processo que são vários volumes? Tá, quando der eu vou, daqui uns dez minutos. Tiago, pode vir aqui com o carrinho pegar processo? Quando der vou. Tiago, pode pegar processo, Tiago? Tiago! Pode pegar processo? Que porra é essa? Tiago! Agonia. Repetição. Por que caralho pensamento se repetindo dessa forma? Drogas? Cola? Inferno.
            Abre os olhos. Vê o teto e as prateleiras desorganizadas girando e depois parando. Sente bermudas e cueca arriadas. Tontura. Bunda suja. Desmaiei no banheiro! Com um único movimento senta de volta na privada. Olha em volta. A porta destrancada. Certifica-se que não há nenhum rastro de merda espalhado. Tenta imaginar o trajeto que seu corpo fez até o chão. Quais partes bateram em quais móveis? Deduz que foi uma queda silenciosa. Sua mãe continua na sala ou na cozinha a cinco passos dali, sem dizer uma palavra. Imagina ela entrando no banheiro segundos antes e o encontrando estirado no chão sem as calças. Se limpa, lava as mãos, olha no espelho. A palidez característica. Vai até a sala, rapidamente busca açúcar, água e despeja tudo num copo. Mistura com uma colher longa e suja. Bebe. Enche mais dois dedos d’água para dissolver os últimos grãos que sobraram no fundo. Agita, bebe. Sua mãe não está lá, nem na cozinha. Não suspeita de nada. Isso é bom. Cai de volta na cama.
             Sono agitado. Acorda. A mesma boca seca, a ânsia um pouco menor. Algo ardendo no lado direito do rosto. Uma gota de sangue no travesseiro. Passa o dedo no arranhão recém descoberto. Tenta imaginar o trajeto que seu corpo fez até o chão. A cara raspando na máquina de lavar. Por sorte os óculos continuam inteiros. Alcança o copo d’água ao lado da cama e dá dois goles. Muda o lado do travesseiro. Muda o lado do corpo. Dorme.